Quando em 1989 eu passei a
voar o Boeing 737-200, um dos destinos frequentes era Rio Branco, capital do
Acre. Gostava do pernoite e sempre
arrumava o que fazer, até porque, a 25 anos atrás não havia internet e nem
todos os hotéis possuíam TV a cabo. Ficávamos no melhor hotel da cidade, o
Pinheiro Palace Hotel, que chamávamos de Pinheiro "Parece" Hotel.
Na época em que há horário
de verão, Rio Branco fica três horas mais cedo que o horário de Brasília, o que
trazia algumas dificuldades para os tripulantes; se acordávamos às 8 da manhã do
horário de Brasília, ainda não havia café da manhã no hotel. Se desejássemos
almoçar a uma da tarde, portanto dez da manhã em Rio Branco, dificilmente
encontrávamos um restaurante.
Certa vez, junto com o
copiloto, sai para procurar um local para tomar uma cervejinha. Já era noite
pelo horário de Brasília, final da tarde em Rio Branco quando nos embrenhamos
num misto de área residencial, com um pouco de comércio, e uns botecos. Tudo
isso sobre palafitas às margens do Rio Acre. Foi um dos locais mais estranhos em que eu já estive; cachorros maltratados passando, lá embaixo ratos circulando,
e a cerveja muito gelada. Apelidei aquele local de Shopping Palafitas. Em 1997 passei a voar o
737-300 e deixei de voar para Rio branco.
No ano passado, portanto 16
anos depois, tive um pernoite em Rio Branco. Quanta mudança! A começar pelo
aeroporto, que foi desativado e um novo construído numa área mais afastada
da cidade. O antigo ficava bem próximo ao centro da cidade e numa época em que
só havia 2 voos por dia da Varig, era comum a decolagem ter um pequeno atraso, pois uns poucos e
assíduos passageiros aguardavam o avião sobrevoar a cidade para então se
dirigirem ao aeroporto, causando atraso no “fechamento do voo”.
A cidade cresceu e melhorou
bastante. As praças estão bem cuidadas e uma grande área chamada Parque da
Maternidade foi criada. A margem do Rio Acre junto ao centro da cidade foi
revitalizada com a construção de uma passarela ligando um lado ao outro da
cidade e com a reforma do mercado onde há restaurantes botecos e comércio. E o
“Shopping Palafitas” não existe mais.
Em minha caminhada pela
cidade fiz questão de visitar o Pinheiro Parece Hotel, digo, Palace Hotel. Não
satisfeito fui caminhando até o local onde era o antigo aeroporto. Foi estranho
caminhar pelo pátio onde por tantas vezes taxiei o 737 “Breguinha”. Onde era a
pista agora é uma avenida, a torre de controle está abandonada, bem como o que
antes era o aeroporto propriamente dito.
Em meio a tantas
mudanças, uma coisa continua igual em Rio Branco: a excelente qualidade do
serviço de “catering”. Até 97, o responsável pelo embarque das
refeições era o Seu Lima, um senhor baixinho que era só simpatia e fazia o
possível e o impossível para agradar os tripulantes. Quando passávamos por Rio
Branco no “voo da subida”, RG 484 São Paulo/Manaus com escalas, fazíamos nosso
pedido de refeição para o voo da volta, que geralmente era um ou dois dias
depois. Filé à Parmegiana, peixe, massa e outros pedidos que o Seu Lima
fornecia em quantidades fartas. No voo da subida embarcava o clássico de Rio Branco;
um bolinho de aipim e um quibe para cada um dos tripulantes. Bolinho é maneira
de dizer, pois eles eram bem grandes e quase sempre levávamos para o hotel em
Manaus para comer na hora da fome. E o bom era que eles vinham embrulhados em
papel alumínio, então bastava colocar no abajur ou na arandela do quarto que o
bolinho ficava incrivelmente aquecido. Coisa de tripulantes.
O Seu Lima não trabalha
mais por lá, deve ter se aposentado, mas não apenas a refeição embarcada em Rio
Branco continua deliciosa, tanto na qualidade quanto na quantidade, como também
a dupla de bolinhos continua a ser fornecida aos tripulantes.
Viva Rio Branco!
Viva Rio Branco!